Durante toda a existência, as pessoas têm picos de satisfação e colecionam projetos que pretendem realizar ao longo dos anos. Enquanto jovens, têm a ideia de que há uma vida inteira para conquistar o que desejam. Até chegarem ao momento em que percebem a idade avançando, abrindo espaço para questionamentos sobre as conquistas pessoais e profissionais até então, bem como para as incertezas diante do futuro. É quando se deparam com a chamada crise da meia-idade.

"Quando as pessoas chegam à essa fase, grande parte das conquistas já foi realizada e elas começam a avaliar tanto o que realizaram quanto o que vão realizar ainda. Algumas vezes, se perdem neste questionamento, entrando em crise", comenta Yuri Busin, psicólogo, doutor em neurociência do comportamento e diretor do Centro de Atenção à Saúde Mental - Equilíbrio (Casme).



Foi avaliando esse cenário que o médico canadense Elliott Jaques criou a expressão crise da meia-idade, lá em 1965. Mais de cinco décadas atrás, a expressão enquadrava pessoas na faixa dos 40-50 anos. A classificação ainda é aceita, mas tem sido estendida por conta do aumento da longevidade humana. Hoje, tende a englobar indivíduos de 50 a 60 anos, mais ou menos.

"O próprio conceito é um pouco vago e ainda há quem questione se realmente existe ou se é só um mito", diz Mario Louzã, psiquiatra, coordenador dos programas de Esquizofrenia (Projesq) e de Déficit de Atenção e Hiperatividade (Prodath) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP.

Como passar pela crise da meia-idade

Ponto de virada

A crise da meia-idade pode ser entendida como aquele ponto de virada – o tal do “turning point” – verificado tanto na vida pessoal como na profissional. Costuma coincidir com momentos importantes e simultâneos, como o ápice da carreira ou aposentadoria, a saída dos filhos de casa – a chamada Síndrome do Ninho Vazio – e até divórcios.

Para as mulheres, ainda bate com a chegada da menopausa, que se instala de forma bem rápida. "É diferente da andropausa, que é lenta e gradual entre os homens", observa o psiquiatra. Por isso, o impacto da crise da meia-idade parece ser maior entre a ala feminina, apesar de não haver estudos que comprovem as impressões.

Resumindo, uma combinação de fatores leva à famigerada crise: mudanças hormonais, perda de vigor físico, quebra de rotina ou estabilidade profissional (enquanto a aposentadoria não sai, nesta fase, dificilmente se avança na carreira) e pessoal (com a solidão pela saída dos filhos de casa e eventual separação).

Autoanálise

Tantos eventos simultâneos podem trazer insegurança, ansiedade, sensação de tédio e vazio, falta de prazer, descontrole financeiro, isolamento social, depressão, assim como obsessão pela aparência, "tentando sempre parecer mais jovem", observa o psicólogo Yuri.

O psiquiatra Mario lembra que o quadro também é influenciado por fatores culturais. É mais comum, por exemplo, no Ocidente. "Nas culturas orientais, como no Japão, em que o idoso tem uma valorização e um respeito muito maior, não existe propriamente essa crise da meia-idade", analisa.

De modo geral, a própria pessoa consegue identificar se está vivendo essa experiência. "As queixas que costumam chegar ao médico, ao psicólogo, são basicamente de que alguma coisa mudou de forma significativa na vida e a pessoa não sabe lidar com isso, pois se sente meio perdida, com um vazio ao não ter mais o que fazer diante de um dia longo, já que as atividades rotineiras não existem mais", descreve o psiquiatra.

Tem saída? É claro! 

Segundo Yuri, a crise da meia-idade costuma durar de 2 a 10 anos entre os homens e 3 a 5 anos no grupo das mulheres.

"Vai depender muito da capacidade da pessoa em se adaptar e reformular a vida. A crise vai realmente cessar quando, de fato, ela tiver se reinventado e mudado aspectos da vida, de tal forma que tenha, de novo, vitalidade, alegria, atividades a desenvolver etc", acrescenta Mario.

Vale lembrar que ser vítima da crise da meia-idade não é o fim do mundo nem traz sequelas ou reflexos sérios nos anos à frente. O melhor conselho para enfrentá-la é se preparar.


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Isso significa se planejar para o futuro, ou melhor, para quando a vida pessoal e profissional registrarem alguma mudança radical – o que tem grande chance de acontecer na vida da maioria das pessoas. "Essa prevenção é um aspecto importante para passar pela idade da crise, sem ter a crise", argumenta o psiquiatra.

O importante é entender que a idade não é, também, um fator que bloqueia as pessoas de viverem. "Tudo será uma questão de perspectiva das situações, como devem ser encaradas e quais novas construções devem ser colocadas como objetivos", opina Yuri.

O que fazer num quadro de crise de meia-idade:

  • É interessante lembrar de desejos passados que nunca foram realizados: hobbies, viagens, profissões alternativas e estudos, por exemplo. E executá-los.
  • Refletir sobre as conquistas do passado e planejar como alcançar o que se deseja é outro passo importante para driblar a crise. "Divida o objetivo em pequenas metas e sempre se renove", sugere Yuri.
  • Repensar a vida pessoal, profissional e amorosa também é necessário para traçar novos planos e metas para o futuro.
  • Diante da dificuldade em avançar ou encontrar uma maneira para se reinventar, vale procurar ajuda profissional de um psicólogo ou psiquiatra. "Buscar uma terapia pode ajudar a rever a vida e planejar o que pode ser e fazer dali para frente, algo que traga novo desafio e interesse", finaliza o psiquiatra Mario.
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