Se você já se aposentou, conheceu a vida mansa e enjoou, é meu convidado de honra para saber como se reinventar e entrar no mercado de trabalho. Não no mercado de emprego, mas de trabalho, mesmo.

Já ouvi muita gente que sonha em se aposentar, ser dono do seu nariz, diminuir o ritmo, trabalhar algumas poucas horas por dia, só para tirar um dinheirinho. Saiba que isso é possível. Quando é isso que se quer, tem que ir atrás. Pode começar por procurar algum amigo, ajudar um filho que precisa de alguém para abrir e fechar a loja, para cuidar do caixa enquanto o dono sai para o almoço, buscar um documento, enfim, alguma coisa que não dê canseira. Vai depender do tamanho da sua ambição ou da sua necessidade.

Conheci uma senhora que, feliz da vida, tendo saído da firma onde trabalhara como copeira a vida toda, se ofereceu para cuidar das roupas dos filhos marmanjos:Em vez de levarem para a lavanderia, tragam pra cá. Rindo gostoso, prosseguiu: - Eu não cobro. Eles é que, antes de sair, deixam algum lá na gaveta da cômoda e eu finjo que não vejo. Eu é que não ia cobrar de filho!  Piscando um olho maroto, arrematou: - É um jeito de eles virem toda semana, também, né? Dão uma passadinha, comem uma coisinha gostosa e as noras não reclamam. Além disso, meu marido não se sente diminuído pelos filhos estarem ajudando. Eles sabem que a gente precisa, mas meu marido é orgulhoso demais. Imagina aceitar que eles põem dinheiro aqui. Assim, é como se fosse um presente para mim, entende?

Caso você tenha habilidades manuais e vontade de trabalhar, com certeza não vai lhe faltar trabalho. Um engenheiro mecânico estava desesperado por não saber o que fazer depois de sair da empresa onde trabalhou por mais de 30 anos: - Não sei fazer nada além do que faço aqui. Muitos anos fazendo a mesma coisa. Não consigo nem pensar onde podem me aproveitar! A cidade é pequena. Não tem nem emprego para os recém-formados, como vai ter para os madurões?!

Desenvolveu um sistema de reuso d’água da chuva e de irrigação de jardins. Hoje diz ele que trabalha mais do que antes, só que muito mais feliz: - Tenho tempo para tudo. Voltei à vida ao ar livre e até tirei doze quilos da pança. Quem não está gostando muito é a patroa. Anda enciumada. Antes ela sabia sempre onde eu estava. Agora reclama que eu sumo de casa e nem dou o endereço onde me achar. E eu lá vou querer esposa no meu pé? Tem dó, diz dando risada. Sabe o que me apavorava? Vou lhe contar: o orgulho. Eu, engenheiro pós-graduado, que viajou o mundo, trabalhar fazer bico? Que bico, que nada! Eu peguei foi na mão da sustentabilidade e quase tiro o mesmo que ganhava lá na fábrica, só que com muito mais gosto! Liberdade. Liberdade.

Outra solução foi adotada pela senhora Carmen. Enfermeira, sempre havia trabalhado em hospital público. Contou que durante seus anos de trabalho sofreu muito assédio: - Não, não era sexual. Moral, mesmo. Os hospitais são um antro de maldade e de perseguição. Fosse uma chefia, vindo com graça para cima de mim, eu metia a mão e fazia o maior escândalo. Era pegação no pé. Privilégios que umas tiram e outras dão. Quer ver? Prestei concurso para fazer pós-graduação. Era eu e uma outra. Tirei a melhor nota. Mas sabe quem foi cursar? A queridinha da chefa! Disse que a outra tinha mais tempo de casa e que ela é que levaria a bolsa. Vai reclamar para quem? Se reclamar acaba ficando sem plantão, mexem na sua escala. Serviço público é isso. O que a gente ganha é pouco, só consegue melhorar quando trabalha também na Fundação. E só trabalha na Fundação quem a chefa deixa entrar.

Após ter se aposentado, suspirou fundo: - Não fico mais nem um dia aqui! Pegou seus poucos pertences e foi fazer um curso de esteticista: - É tudo orgulho. Tudo aparência. Minha família, todos nós ficamos tão orgulhosos quando me formei! Fui a primeira da família a ter curso superior. Meus pais até choraram! Meus irmãos mais velhos não puderam estudar. Só eu ganhei o canudo. Logo busquei segurança. Prestei concurso e entrei. Não demorou nadinha. Mal sabia o mal que estaria fazendo contra a minha pessoa. Teve tempos em que precisei ser afastada, tanto que eu sofria por conta de perseguição. Injustiça. Se você não matar, não roubar, não traficar dentro do hospital, ninguém te bota para fora, não! Então, tem um bando de gente maldosa que parece ter prazer em humilhar os outros.

Como esteticista, foi fazer um curso de marketing pessoal, abriu uma página através da qual se divulga. Especializou-se em adolescentes. Não lhe faltam clientes. Cobra menos do que deveria, ela conta, mas não fica parada: - Fui morar com uma amiga, que é costureira. Ela divulga meus serviços, eu os dela. Uma coisa leva à outra. Nós formamos nossa clientela e até oferecemos um lanchinho para quem vem. É uma casa de cinco cômodos. Cada qual tem seu espaço. Cuidamos da beleza e da autoestima. As mulheres querem parecer mais magras. Os adolescentes se sentem infelizes quando têm espinhas. E nós duas agora fazemos biscoitos de aveia e sucos Detox. Até damos conselhos de alimentação. É o melhor dos mundos.

Há mais de 35 anos desenvolvo e ministro cursos de PPA – Preparo para a Aposentadoria e Pós-carreira. Desde cedo, tirei minhas conclusões. Dentre elas, uma das mais preciosas: pode faltar emprego, mas não falta trabalho. O orgulho, o ego inflado, achar-se melhor do que os outros é uma bomba venenosa, para quem quer fazer algo que presta e sentir-se útil.

Quer se sentir útil? Faça algo de útil. Sirva os outros e sinta um verdadeiro orgulho de si mesmo! Sem falsos brilhos. Quer realizar algo de bom? Se querer é poder, melhor poder querer, que querer poder. Simplifique. Largue a vaidade e abrace a sinceridade. Outro lema: - Antes de ter amor ao que você faz, tenha amor ao trabalho. De resto, fazendo bem feito, você aprende a amar o que fará.

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