Enquanto o governo estuda novos critérios para a Previdência no país, trabalhadores brasileiros com mais de 60 anos já experimentam na prática uma situação que não se pauta necessariamente por mudanças nessa legislação: a falta de vagas de emprego.

Segundo um levantamento realizado pela VAGAS.com, empresa de soluções tecnológicas para recrutamento e seleção, 72% dos profissionais aposentados ou em idade para se aposentar no Brasil afirmam estar desempregados. Em estudo semelhante de 2012, essa fatia era de 48%.

Dos 2.367 respondentes da pesquisa – com idade média de 62 anos e em sua maioria homens (85%) –, 62% estão aposentados; em 2012, eram 82%. Desse universo dos que já oficialmente se aposentaram, 76% não trabalham mais ou estão sem emprego, condição de 53% há cinco anos.

Um dado importante do estudo é que, dessa base dos que estão fora do mercado, a quase totalidade (99%) diz buscar uma colocação. “Com todo o achatamento da economia, o aumento da inflação ao longo dos anos e a diminuição do poder de compra, 57% desses profissionais buscam um complemento de renda”, justifica Rafael Urbano, especialista em inteligência de negócios da VAGAS.com. Em 2012, 47% tinham essa intenção.

Na contramão desse movimento, as oportunidades de trabalho para esse público minguaram nas empresas. A pesquisa mostra que 17% dos aposentados sem emprego ou que não mais trabalham receberam alguma proposta para voltar ao mercado nos últimos três meses. Em 2012, 36% haviam tido essa oportunidade.

“Dependendo do nível da vaga, as companhias veem essa mão de obra como mais onerosa por ser mais especializada”, afirma Urbano. “As chances de conseguir uma posição são maiores se a função é operacional.”

“O que recebo da Previdência praticamente equivale ao que ganhava só em benefícios no banco”

Aposentado desde 2011, Antonio Roberto da Silva, hoje com 61 anos, tem sentido na pele a dificuldade de obter uma nova chance como especialista em sistemas, cargo que ocupou no Itaú durante os seis anos que antecederam sua parada.

“O que recebo da Previdência praticamente equivale ao que ganhava só em benefícios no banco”, compara. “Precisava de um novo trabalho não só para continuar com uma atividade produtiva, mas também pelo dinheiro.”

Passou, então, a colaborar com o orçamento da casa prestando consultoria em sua área, enquanto mandava currículos em busca de uma vaga registrada. “Quando me chamavam para uma entrevista, percebia que a idade pesava para que não fosse escolhido”, afirma. “Depois dos 50 anos, é muito difícil conseguir um novo emprego.”

 “Que faço agora com essa merreca?”

Quando se aposentou, em julho de 2016, Marlene Pereira Chourri, de 60 anos, também sentiu que o dinheiro que receberia do governo não seria suficiente para manter seu padrão de vida.  “Que faço agora com essa merreca?”, foi o que ela pensou, temendo pela falta de recursos para manter seus hobbies – idas ao teatro e a shows.

Com um currículo bem recheado – foram 18 anos em um grande banco e passagens por áreas financeiras de empresas de ramos diversos –, Marlene diz que não conseguiu agendar entrevistas por consultorias gerais de recolocação. Só obteve sucesso por uma especializada no público 50+, a MaturiJobs.

Há cerca de um mês, ela trabalha como controller “home office” da Reos Partners, uma empresa de consultoria em sustentabilidade. “Levo vantagem em relação à molecada pela experiência e pelo comprometimento”, afirma. Seu escritório doméstico ainda está improvisado na cozinha, mas ela já providencia uma reforma na sala para adaptar um espaço para as tarefas da empresa.

Marlene diz que pretende continuar na ativa profissional ad aeternum. O tempo em que os aposentados ainda querem dedicar ao exercício de uma atividade produtiva remunerada, por sinal, também foi tema da pesquisa da VAGAS.com.

“O dinheiro sempre faz falta, mas a gente se adapta ao pouco que tem para passar”

Dos que estão sem emprego ou não trabalham (76% do total), 43% têm disposição para ficar no mercado por um período de 5 a 10 anos – eram 40% em 2012. Os que planejam de 10 a 15 anos de trabalho somam 17%, ante 8% há cinco anos, enquanto 19% projetam no máximo mais cinco anos de labuta. Outros 19% afirmam que desejam trabalhar até o final da vida – caso da controller –, e 4% veem um horizonte de mais de 15 anos de atividade profissional.

Entre esses cenários, há quem prefira mesmo “pendurar as chuteiras” de vez. Caso de Manoel Donizete de Andrade, 61 anos, aposentado há um. “Trabalhei durante 43 anos, emendando finais de ano e tirando férias de 10 ou 15 dias no máximo”, conta. “Agora vou me dedicar à prática de corrida, em maratonas e meias-maratonas. “O dinheiro sempre faz falta, mas a gente se adapta ao pouco que tem para passar.”

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