“Eu!?!” Foi dessa forma que a estudante de pedagogia Mariza Rosa Ferreira Santos, 50 anos, reagiu, no ano passado, quando foi aprovada em uma seleção de estágio. Incrédula, imaginava que os colegas mais jovens teriam mais chance de conquistar a vaga. “Entendi que buscavam pessoas com muita responsabilidade, e a idade pesou a meu favor”, diz ela, que passou a acreditar em oportunidades para estagiários com mais de 50 anos.

Assim como ela, milhares de pessoas com mais de 50 anos que voltaram a estudar têm buscado aplicar na prática o que aprendem na sala de aula. No CIEE (Centro de Integração Empresa-Escola), foram registrados 2.794 alunos de cursos superiores nesta faixa etária em vagas de estágio – número pouco acima dos 2.716 de 2016. Até o fim de fevereiro deste ano, havia 1.554 estagiários ativos.

O superintendente nacional de atendimento do CIEE, Luiz Gustavo Coppola, explica que o início do ano registra menos contratos devido ao desligamento dos que já se formaram. Ao longo dos meses, nota-se uma absorção maior, não só dos alunos com mais de 50 anos, mas também dos mais jovens.

Ele destaca que o acesso mais fácil às universidades, o incremento do número de faculdades e de cursos, o menor custo da graduação e a ampliação de opções de cursos online levam cada vez mais alunos com mais de 50 anos aos bancos escolares. O aumento da longevidade também tem impulsionado esse número, segundo o superintendente.

“As pessoas querem uma vida laboral mais ativa e percebem que uma única carreira não é suficiente para garantir trabalho por mais tempo. Não é só necessidade de renda. Elas voltam para a faculdade para realizar um sonho.”

Vantagem de quem?

Coppola defende que pessoas mais velhas levam vantagem na competição com os mais novos por um estágio. Todos têm o mesmo conhecimento teórico, mas os primeiros já conhecem o funcionamento de uma empresa, sabem a importância do relacionamento interpessoal e valorizam a troca de experiência, diz. “E permanecem na empresa por mais tempo, provocando menos rotatividade na equipe.”


Quer se manter atualizado para o mercado de trabalho? Conheça os cursos gratuitos oferecidos pelo Instituto de Longevidade a quem tem mais de 50 anos


Para a gerente de treinamento do Nube (Núcleo Brasileiro de Estágios), Yolanda Brandão, no entanto, os contratantes costumam ter expectativa de abrir as portas para um jovem. Não significa que todas descartem quem tem mais experiência profissional e de vida. Mas conquistar a vaga exige mais preparo.

“As pessoas vão ser perguntadas sobre a escolha profissional e os objetivos, e nem todas têm essas questões muito esclarecidas”, considera ela. “Onde esse curso se encaixa em um plano de carreira?” é uma das que têm que estar com a resposta na ponta da língua.

Diferenciais

Começar de novo, explica Brandão, não significa jogar fora toda a bagagem profissional. Até porque os mais velhos têm “uma relação diferente com o trabalho”, que agrada aos recrutadores. O “vestir a camisa”, que não faz sentido para a geração Y, era quase um mantra para os X e baby boomers. Isso se reflete em mais comprometimento, segundo ela.

Na entrevista, diz ela, é importante valorizar as conquistas profissionais e trazer à tona informações que convençam o selecionador de que a contratação de estagiários com mais de 50 anos é um bom negócio para a equipe.

E evitar a todo o custo frases como “ninguém me dá oportunidade” e “ai, por favor, me dê uma chance porque estou desesperado”, que colocam o recrutador em uma posição desconfortável e passam uma imagem negativa do candidato.

Na busca por vagas, vale conversar com professores e pedir auxílio no núcleo de estágio da faculdade, além de investir em pesquisas em sites e plataformas voltadas a estagiários.

Se mesmo assim não encontrar nenhuma, Brandão orienta a procurar por monitorias na faculdade, buscar programas de iniciação científica e pesquisar sobre a empresa júnior da instituição, além de acionar a rede de contatos.

Nem só na universidade

No Nube, o número de estagiários com mais de 50 anos de ensinos médio e superior foi de 33 em 2016 e de 29 em 2017. Até o fim de fevereiro deste ano, 21 pessoas nessa faixa etária estavam estagiando, entre elas Laurinda Mendes da Costa Horta, 55 anos, aluna de curso técnico em administração de empresas.

A hoje estudante já ostentava um diploma de curso superior em administração de empresas. No terceiro ano de faculdade, foi admitida em uma editora de livros. Ficou lá 23 anos, até 2013, quando perdeu a vaga na área de planejamento e controle financeiro em uma demissão coletiva. Um dos argumentos que ouviu para a dispensa foi a falta de investimento em cursos e aperfeiçoamento.

Conseguiu uma vaga na área de telemarketing, mas é um campo que “não agrega, só consome”, segundo ela. Na busca por trabalho, viu o anúncio de um curso técnico. Inscreveu-se no começo do ano passado e, em abril, foi contratada como estagiária em uma universidade. Não antes de concorrer a muitas vagas e não receber retorno.

“Não tenho vergonha de ter dado um passo atrás”, diz ela, explicando que a experiência tem sido rica em termos de conhecimento e aprendizado. O próximo passo é formar-se e fazer a inscrição em uma pós-graduação. “Não me vejo sem trabalho. Faz bem para mim e para minha cabeça.”

Leia também: “Levei 3 meses para enviar meu currículo, mas fui contratada em 2 semanas”, diz livreira

Compartilhe com seus amigos