Quando começamos a enfrentar o coronavírus, não sabíamos o que estava por vir. E quanta mudança ele trouxe! Na vida, na rotina, nos hábitos, na saúde. Já se passaram longos meses e o fim deste capítulo parece ainda não ter data certa para acabar. Temos diversas vacinas em fase de testes, mas nenhuma efetivamente pronta para ser aplicada.

Ao longo deste período, foi preciso aprender a conviver com o vírus e fazer uma série de adaptações para enfrentar a pandemia. Porém, a compreensão dos efeitos da contaminação, bem como as formas de prevenção e consequências em longo prazo, são avaliadas e estudadas até hoje. Essas incertezas e questões que cercam o tema geram ansiedade e muita expectativa. Estudos já identificaram as fases de evolução da doença e indicam a melhor maneira de tratá-las. Porém, seguimos observando o vírus se propagar e uma nova onda da Covid-19 atingir diversos países do mundo. Já são mais de 50 milhões de pessoas contaminadas e de 1,3 milhão de mortes.

O que fazer então? Por hora, cabe a nós seguir mantendo todos os cuidados e orientações para evitar a doença. A prevenção é a melhor forma de se proteger. Isso porque se não bastasse enfrentar o coronavírus, ainda é preciso se preocupar com os possíveis efeitos deixados por ele, com períodos longos de recuperação ou até sequelas, que podem ser permanentes e graves.

Sabemos hoje que o principal órgão comprometido é o pulmão. No entanto, aos poucos, a classe médica e científica foi tomando conhecimento do potencial agressivo da doença e das lesões causadas em órgãos e tecidos. Já está comprovado que certos pacientes apresentaram alterações no coração, cérebro e aparelhos digestivo e circulatório, por exemplo.

Aqui vamos abordar especificamente os impactos da Covid para as doenças cardiovasculares. E para facilitar, dividiremos em três grupos: pessoas que não têm nenhum problema cardiovascular, mas adquiriram hábitos perigosos para a saúde do coração durante a pandemia; para quem está dentro do grupo que apresenta fatores de risco aos eventos cardiovasculares ou já sofre com alguma disfunção no órgão e está em tratamento; e para quem enfrentou o coronavírus e apresenta sequelas cardíacas.

“Não tenho problema cardiovascular, mas adquiri hábitos perigosos para a saúde do coração”

Vamos começar pelo mais fácil de resolver, aquele que, normalmente, só depende da consciência de cada um. Pesquisas recentes trazem um alerta: as pessoas estão bebendo com mais frequência e em maior quantidade desde o início da pandemia da Covid-19. De acordo com um estudo realizado em parceria pela Fiocruz, UFMG e Unicamp, cerca de 18% dos brasileiros estão consumindo mais bebidas alcoólicas.

O álcool, usado como válvula de escape para, momentaneamente, proporcionar a sensação de bem-estar, descontração e relaxamento, pode ser perigoso. Seu consumo excessivo aumenta, por exemplo, a pressão arterial e os níveis de gordura no organismo, gera obesidade, disfunção hepática, depressão, câncer, alcoolismo e é capaz até desencadear um ataque cardíaco ou acidente vascular cerebral (AVC).

Outro risco também ligado a compensação está nos alimentos. Não é difícil encontrar pessoas que ganharam uns quilinhos extras desde que a pandemia começou por aqui. Seu cardápio diário passou a incluir frituras, alimentos processados, gordura saturada, açúcar e embutidos? Tenha cuidado! O consumo exagerado de sódio pode provocar insuficiência renal, AVC e hipertensão. As gorduras saturadas por sua vez aumentam significativamente o risco de entupimento das artérias do coração e obesidade.

E aqui cabe mais um alerta, o sedentarismo. Meses com parques e academias fechados acabaram servindo de desculpa para muitas pessoas não praticarem nenhuma atividade física regular. Porém, saiba que isso pode estimular o ganho de peso, prejudicar a circulação do sangue, aumentar o risco de varizes e complicar a saúde do coração. Assim, mesmo que de forma adaptada e com menor intensidade é importante manter os exercícios na rotina. A prática regular, pelo menos três vezes por semana, favorece a diminuição do colesterol ruim (LDL) e aumenta o nível do bom (HDL) no sangue, isso só para citar alguns dos benefícios.

Aqui entram ainda o cigarro, a irregularidade do sono, o estresse, entre outros. Por isso, se você andou descuidando e adquiriu ou notou alguns desses hábitos ganharem mais espaço no seu dia a dia, atenção! É importante monitorar fatores que interferem no sistema cardiovascular, como diabetes e hipertensão. Uma hora a pandemia vai passar e estar bem e saudável, imagino, seja o desejo de todos. O coração, certamente, agradece!

“Já tenho problema no coração diagnosticado e estou em tratamento”

Pelo alto poder de contágio do coronavírus, as medidas de prevenção individuais, principalmente para as pessoas com doenças no coração, devem ser redobradas - como a lavagem das mãos, distanciamento ou isolamento social e o uso de máscaras.

Sim, o cuidado é o mesmo para todos, porém, nesse grupo é ainda mais importante para evitar a doença. Isso porque, se para quem não tem transtorno cardiovascular preexistente existem possíveis complicações, para aqueles com histórico cardíaco ou fatores de risco, como cardiopatias, pressão e colesterol altos, diabetes e obesidade, as chances de um quadro mais grave ou de sequelas sérias é ainda maior.

Para explicar melhor: a Covid-19 tem três fases de evolução. A primeira, de multiplicação viral, depende das defesas imunológicas do corpo no combate ao vírus. Sem a reação necessária do organismo, ela avança para a fase dois, quando ocorre uma atividade inflamatória inicial, estágio em que o pulmão é o órgão alvo, levando a alterações respiratórias e a possibilidade de redução da oxigenação. Caso a doença não seja controlada, ela passa então para a fase três, momento em que há uma hiperinflamação, que além de agravar a situação pulmonar, atinge quase todos os órgãos e tecidos, com sérias consequências e risco de morte.

No caso do coração, mesmo com a ausência de doenças cardíacas anteriores, ele pode ser atingido a partir da fase dois e por diversos mecanismos, que vão desde lesões diretas pelo vírus no músculo cardíaco (o miocárdio) até complicações secundárias em resposta inflamatória e trombótica desencadeada pela infecção. Assim, pacientes com doenças cardiovasculares prévias que já têm tendência a alterações em seu sistema imunológico, além de um estado inflamatório crônico latente, podem ter o quadro agravado pela fase inflamatória desencadeada pelo coronavírus, piorando, por consequência, a evolução da doença cardiovascular.

Segundo um boletim emitido pelo American College of Cardiology, a taxa de mortalidade para pacientes com doenças cardiovasculares que contraem o coronavírus é de 10,5%. Além disso, o relatório sugere que pessoas com idade acima de 65 anos com a doença cardíaca coronária ou hipertensão estão mais suscetíveis à Covid-19.

Reforço, portanto, que tratamentos de doenças crônicas e problemas no coração já diagnosticados devem ser mantidos com monitoramento médico (a telemedicina está aí para ajudar), assim como os cuidados preventivos para a Covid. Vale destacar ainda a importância de estar em dia com as vacinas, especialmente de gripe, com o objetivo de evitar uma infecção secundária caso o paciente cardíaco ou em risco de complicações cardiovasculares seja acometido pelo coronavírus.

“Tive Covid, que sequelas cardiovasculares eu posso apresentar?”

Alguns estudos apontam que, mesmo 60 dias após o término dos sintomas da Covid-19, ou seja, quando o paciente já está sem febre, falta de ar ou tosse, mas avaliado detalhadamente por sua situação cardíaca, percebe-se que quase 80% ainda tem algum grau de inflamação no coração.

E os dados de pesquisas mais recentes têm mostrado que os danos mais graves do coronavírus podem ser no órgão. A miocardite (inflamação do miocárdio) associada à Covid é um dos problemas que muitos médicos começaram a notar com mais frequência, mesmo em pacientes que não apresentaram um quadro grave e até entre assintomáticos. Como esse músculo é responsável pela contração do coração, a inflamação acaba prejudicando o bombeamento do sangue pelo corpo.

A miocardite não é uma condição necessariamente grave, mas, em alguns casos, pode levar à insuficiência cardíaca e, mais raramente, até a necessidade de transplante do órgão. Neste sentido, um estudo publicado no Jama Cardiology apresentou uma informação preocupante: autópsias feitas em 39 pacientes que morreram de Covid-19 revelaram a presença do vírus no miocárdio em 60% dos casos.

Outra possível consequência ocorre se a resposta do sistema imunológico à infecção for muito intensa. Nestes casos, há chances do processo reativo atingir também o coração. Ao detectar a presença do vírus, o sistema imunológico se defende atacando as células infectadas. Quando o corpo reage de maneira vigorosa, corremos o risco de destruir tecidos saudáveis do coração e, desta forma, prejudicar seu funcionamento.

Em razão dessa ação do corpo contra o vírus, o coração também acaba afetado indiretamente. O órgão pode ser comprometido pela redução na concentração de oxigênio gerada pela disfunção dos pulmões, pela liberação de citocinas (capazes de reduzir a função cardíaca) e por isquemia, devido à formação de coágulos na microcirculação. Isso tudo nos leva a considerar a possibilidade de a atividade inflamatória gerada pela Covid persistir de maneira silenciosa e com manifestação tardia. Assim, existe a possibilidade de ocorrer uma sequela crônica, fazendo com que pacientes supostamente recuperados precisem de acompanhamento e reabilitação.

Cientistas em diversas partes do mundo ainda tentam entender profundamente como o coronavírus causa todas essas sequelas já constatadas. Ou seja, há ainda muitas dúvidas, até porque as pesquisas estão ocorrendo quase que simultaneamente ao avanço do vírus, da busca por medicamentos e vacinas. No entanto, é preciso cautela, atenção e, acima de tudo, o entendimento de que a pandemia não acabou. Por isso, mantenha os cuidados por você e por todos aqueles que estão ao seu redor.

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