Ele já foi apresentado como uma alternativa segura ao tabaco. Virou moda. Ganhou design moderno, cores e sabores. Mas o jogo virou para o cigarro eletrônico.

Dos EUA, começam a chegar relatos sobre os malefícios que ele pode produzir à saúde. E o que, a princípio, parecia inofensivo tornou-se um problema de saúde pública em alguns países.

A seguir, a diretora da ONG ACT Promoção da Saúde Anna Monteiro e o cirurgião oncológico e diretor-executivo da Fundação do Câncer, Luiz Augusto Maltoni Jr., contam o que você precisa saber sobre cigarro eletrônico.

O cigarro eletrônico é seguro?

“Não existe produto de tabaco seguro”, informa Maltoni Jr. E os cigarros eletrônicos estão incluídos aí: “Eles tentam passar a ideia de modernidade, com produtos similares a pendrives e outros, com sabores diversos, para atrair os jovens que já têm internalizado que o cigarro tradicional faz mal à saúde”.

Ele vicia?

Sim, e por vários motivos. O primeiro e mais conhecido é a presença de nicotina. “É esse componente responsável pelo vício. Além disso, possui uma série de substâncias tóxicas e cancerígenas”, diz o médico. Mas ele lembra que há mais do que a dependência física e química. “Ela é também psicológica e comportamental.”

E os que não liberam nicotina? 

Pois bem, não é apenas a nicotina que faz mal à saúde. O especialista explica que os cigarros eletrônicos aquecem um líquido para produzir um aerossol, que é inalado pelos usuários. “Esse líquido pode conter diversas substâncias que dão sabor e que, misturadas, provocam outras alterações, que não sabemos ainda o real efeito no ser humano.”

Qual é o impacto do fumo na meia-idade?

É sabido que o tabagismo impacta negativamente a expectativa de vida. Basta dizer que, atualmente, é a principal causa de morte evitável.

Mas não é só isso: o fumo compromete também a qualidade de vida, sendo um acelerador do processo de envelhecimento. Uma pesquisa com 149 mil pessoas, com média de idade de 55 anos, mostrou que a idade biológica dos fumantes é o dobro da cronológica, quando comparados aos não fumantes.


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E parar, especialmente para quem passou dos 50, pode ser mais difícil, indica outro estudo. Em geral, essas pessoas têm maior dependência da nicotina, de acordo com os pesquisadores. Vale lembrar que o cigarro eletrônico também pode conter essa substância.

Cigarro eletrônico e cigarro aquecido são similares? 

Os chamados DEFs (dispositivos eletrônicos para fumar) abrangem cigarros eletrônicos, e-cigs e vaporizadores. A diretora da ONG ACT Promoção da Saúde esclarece que os primeiros “usam uma bateria para aquecer um líquido, que geralmente contém nicotina e sabores, produzindo um aerossol, inalado pelo usuário”.

Nos produtos de tabaco aquecido, há uma bateria que aquece um cigarro ou um bastão de tabaco para produzir um aerossol. “Também contêm nicotina e outros produtos químicos, que são inalados”, diz ela, acrescentando que, “em razão de seu vapor, os usuários desses dispositivos não se consideram fumantes, mas sim ‘vapers’”. 

O cigarro eletrônico é liberado no Brasil?

Ainda que se possa encontrar DEFs no mercado paralelo, a importação, a comercialização e a propaganda desses produtos são proibidas no país desde 2009. A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) informa que a segurança dos dispositivos não é comprovada, mas tem discutido o assunto.

Por que se tornaram populares fora do Brasil?

“Lançados no mercado com o pretexto de ajudar fumantes a se livrar da dependência de nicotina, os DEFs acabaram sendo usado maciçamente por jovens, na iniciação ao fumo”, avalia Anna. Um dos mais conhecidos, por exemplo, pode ser carregado na porta USB do computador e é vendido em diversos sabores, como creme, manga e menta.

A adesão dos jovens cresceu de forma “alarmante”, segundo um relatório do Surgeon General, órgão do governo americano. De 2011 a 2015, esse aumento foi de 900% entre estudantes de ensino médio. “O uso de cigarro eletrônico entre jovens e adultos dos EUA é agora uma grande preocupação de saúde pública”, indica o texto.

Que malefícios o cigarro eletrônico pode trazer à saúde?

Ele pode provocar doenças cardiovasculares, neurológicas e o câncer. E também lesões pulmonares graves, informa o médico. O CDC investiga um surto de lesão pulmonar associada ao uso de produtos de cigarro eletrônico nos EUA. Até 29 de outubro deste ano, haviam sido relatados 1.888 casos, incluindo 37 mortes. Os dados são atualizados semanalmente.

Pesquisas recentes mostram que:

- O cigarro eletrônico prejudica a fertilidade. Um estudo publicado no periódico científico “Journal of the Endocrine Society” indicou que camundongos expostos ao vapor do dispositivo tiveram um atraso no início da primeira ninhada, em relação aos que não tiveram contato com a substância.

- Outro estudo com camundongos, este feito por 54 semanas por pesquisadores da New York University, indicou que o vapor do cigarro eletrônico com nicotina causa câncer de pulmão. Também foram constatadas lesões pré-cancerosas na bexiga de 57,5% dos animais.

- Usuários de cigarros eletrônicos têm mais chances de desenvolver infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral, depressão e ansiedade e problemas circulatórios. O estudo, publicado no periódico científico “Journal of the American College of Cardiology”, reforça, contudo, que são precisos mais estudos para estabelecer a ligação causal entre as doenças e o dispositivo.

O cigarro eletrônico pode comprometer a política nacional de combate ao fumo?

“Com certeza. É um retrocesso, uma vez que, ao longo dos anos, conseguiu-se a redução de 40% do número de fumantes e uma geração de jovens que realmente sabe que o cigarro faz mal à saúde”, reforça o cirurgião oncológico.

Essa diminuição, segundo dados divulgados neste ano pelo Ministério da Saúde, foi observada nos últimos 12 anos. Os dados mostram ainda que 9,3% dos brasileiros afirmavam ser fumantes em 2018. “Se os brasileiros estão deixando de fumar, é resultado de muitas lutas e articulações no fomento de políticas públicas de controle do tabagismo”, assinala o médico.

“Medidas como política de preços e impostos, restrição da publicidade, ambientes livres de fumo, entre outras, foram fundamentais para essa conquista, e é preciso avançar”, pondera a diretora da ONG ACT Promoção da Saúde.

Ele acrescenta: “Liberar cigarros eletrônicos ou de tabaco aquecidos não é uma saída para diminuir a dependência ao fumo”. O problema, segundo Maltoni Jr., “está exatamente no fato de que indústria do tabaco não é clara e tenta passar a ideia aos jovens de que esses produtos, por não existir a combustão como nos cigarros tradicionais, são menos danosos à saúde, o que não é verdade”.

Por que as pessoas se sentem atraídas pelo cigarro eletrônico?

Há uma combinação de novas tecnologias com estratégias de marketing, segundo Monteiro. “Algumas [indústrias] usam mensagens que afirmam explícita ou implicitamente que são alternativas mais seguras e menos tóxicas aos cigarros convencionais”, diz ela.

Outro ponto são as publicidades “com modelos jovens e atraentes, patrocínio de eventos e festas esportivas, colocação de produtos e uso de influenciadores de mídias sociais”, segundo a executiva.

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