A grande maioria dos amantes da Música tem um verdadeiro fascínio pela voz feminina. Muitos deles chegam a considerar a voz feminina como o mais belo dos instrumentos.

O Brasil é um país de cantoras. O lançamento do primeiro disco de acetato em 1902 foi o marco do nascimento da indústria do disco no país. Se não havia cantoras nesse alvorecer é porque o preconceito e as conjunturas de uma sociedade conservadora e machista não permitiam. Mas elas estavam lá, cantando em tudo que é canto, às escondidas. A única via “profissional” existente eram os teatros de revista e seus espetáculos musicais, considerados “proibidos” para pessoas de “fino trato”.

Uma outra forte razão para não existirem discos de mulheres no início do século passado eram os métodos de gravação extremamente precários. Os gravadores de voz mecânicos exigiam um esforço descomunal dos cantores para sensibilizar a membrana de um cilindro metálico que transformava as ondas sonoras produzidas pela voz humana em movimento. Uma outra peça dotada de um ponteiro de metal, sulcava a cera de um disco de acetato que viria ser a matriz. Portanto, além de toda a sorte de preconceito contra as artistas, não havia mulher que conseguisse movimentar a geringonça.

Com o advento da gravação eletromagnética em 1927 e o abrandamento muito lento porém gradual das restrições da sociedade, as cantoras começaram a surgir.  Os anos 40 já apresentam a mulher como integrante da indústria do disco e, com o passar do tempo, a voz feminina passou a ter importância igual ou até maior do que a voz masculina no âmbito da música popular.

A última coluna trouxe várias cantoras estrangeiras cantando em português. Esta tem como tema versões bem interessantes de clássicos do nosso cancioneiro interpretados por ótimas cantoras brasileiras de vários estilos.

NEM EU - ADRIANA MACIEL

Adriana Maciel nasceu em Brasília em 1966. Estudou canto e flauta transversal na Universidade de Brasília. É mestre e doutoranda de Literatura Brasileira pela PUC Rio. Tem 4 discos gravados além de participar de várias coletâneas de música brasileira. Sua voz suave se adapta muito bem a este clássico de Dorival Caymmi com direito ao acompanhamento de um inacreditável violão de colo havaiano executado por Christiaan Oyens.

SAMBA DA BENÇÃO - BEBEL GILBERTO

Bebel Gilberto nasceu em Nova Iorque em 1966. Tem ascendência familiar e artística para ninguém botar defeito: é filha do mito João Gilberto e da cantora Miúcha, e sobrinha de Chico Buarque. Só podia nascer afinada com um parentesco desses. Tem 8 discos gravados sem contar uma longa lista de discos remix ou de participações especiais. Bebel é inegavelmente a mais genuína filha da Bossa Nova e sua carreira é marcada fortemente pela batida da bossa aliada a uma camada suave de música eletrônica. Esta gravação ao vivo do clássico "Samba da Benção" de Baden Powell e Vinícius de Moraes é um exemplo acabado de seu estilo peculiar.

OLHA PRO CÉU – CEUMAR

Esta mineira de Itanhandú, cidade do sul de Minas Gerais, nasceu em 1969. Ceumar é uma das melhores cantoras brasileiras das últimas gerações. Tem 6 discos gravados na carreira. Afinadíssima, faz todas as vozes nesta maravilhosa gravação de "Olha pro Céu" de Luiz Gonzaga e José Fernandes, presente em seu primeiro disco, "Dindinha", de 2000. Um arraso. Uma das mais bonitas definições de Ceumar foi feita pela cantora, compositora e instrumentista Badi Assad: "Quando a ouvimos cantar temos certeza de que ela é a natureza encarnada. Soa, em seu canto, o nascer do sol, o brilhar da lua, o voar do beija-flor… E ela sorri, entra em seu barco e nos leva rio adentro".

CORDAS DE AÇO - GAL COSTA

A baiana Maria da Graça Costa Penna Burgos, ou mais simplesmente, Gal Costa, ou mais simplesmente ainda, Gal, dispensa maiores apresentações. Gal é uma das maiores cantoras da música brasileira de todos os tempos. A sua interpretação perfeita para a linda "Cordas de Aço" de Cartola, presente no disco "Gal", de 1992, não deixa a menor dúvida sobre a sua participação no "ranking" das nossas divas. O violão, irretocável, é de Marco Pereira.

POR CAUSA DE VOCÊ - IZZY GORDON

Izzy Gordon é paulistana e nasceu em 1963. Filha de um grande personagem da noite de São Paulo, o cantor e músico Dave Gordon, é sobrinha da autora da letra deste clássico da música brasileira, "Por Causa de Você", Dolores Duran. O vídeo associado a este texto é do Programa "Ensaio" da TV Cultura. Logo no início do vídeo, Izzy relembra a famosa história da canção. Vale a pena ouví-la pois este é um dos "causos" mais bonitos envolvendo Tom Jobim, Vinícius de Moraes e Dolores Duran.

Izzy tem apenas 3 discos gravados mas tem uma longa carreira como cantora de jazz, blues, "standards" americanos, soul music além, é claro, da música brasileira. Izzy tem inúmeros recursos vocais e coleciona elogios de grandes figuras da música do mundo como, por exemplo, Quincy Jones e Bono Vox. Nesta apresentação, ela faz, na seqüência, a versão em inglês do clássico de Tom e Dolores.

GAROTA DE IPANEMA - MARINA LIMA

A carioca Marina Lima é pura elegância. Musa pop por excelência, compositora, cantora, instrumentista, Marina tem uma carreira pontilhada de sucessos e canções emblemáticas. "Garota de Ipanema" poderia ser apenas mais uma das centenas gravações do grande clássico da Bossa Nova mas não é. A versão ultra moderna e cool de Marina pertence ao disco "Próxima Parada", de 1989. A "Garota" de Marina é diferente, instigante, atual. Sim, atual, embora já tenha sido gravada há 28 anos!

DISPARADA - ZIZI POSSI

Zizi Possi, paulistana nascida em 1956, é das grandes cantoras que brilham na Seleção Brasileira da nossa música popular. Voz clara, límpida, poderosa, dicção perfeita, Zizi tem uma carreira de transformações. Cantora de grandes sucessos de venda no início da carreira foi se transformando com o tempo em uma das nossas divas da chamada MPB. É sempre prazeroso ouvir as versões que a cantora faz de nossos clássicos e de outros países. Não é diferente com esta estupenda gravação de "Disparada" de Geraldo Vandré e Théo de Barros, uma canção histórica, vencedora do lendário Festival de Música Brasileira da TV Record, de 1966. A versão de Zizi, apenas voz e piano, mais "urbana", está no disco "Puro Prazer", de 1999. Uma beleza!

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