Por trás da fama sempre existem algumas histórias que permanecem camufladas durante anos a fio. São fatos que nunca vieram a público por motivos diversos, seja por exigência dos marqueteiros, seja por simples esquecimento, ou ainda por questões judiciais, e até mesmo por vergonha dos envolvidos. No caso da maior banda de pop-rock do planeta, não é diferente. Os Beatles também têm seus segredinhos que, volta e meia, deixam o anonimato por inconfidências surpreendentes, achados fortuitos, quebras de promessas ou jogadas promocionais. Esta crônica traz alguns deles para comemorar os 50 anos do fim do maior fenômeno musical do século XX como banda, porque como mitos, seus quatro integrantes continuam poderosos e valem manchetes até hoje.

No início da carreira, o grupo era composto por cinco elementos; três guitarristas, um baixista e um baterista, e chamava-se ‘Long John & The Silver Beetles’. Chegou a viajar para Hamburgo, na Alemanha, com esta formação e nome. Porém, as coisas desandaram durante a segunda temporada naquela cidade. Paul McCartney não gostava do baixista Stewart Sutcliffe, amigo querido de Lennon. Brigavam constantemente, muitas vezes até as vias de fato. Stu não entendia do riscado e, desinteressado, decidiu ficar na terra do chucrute quando o conjunto se preparava para voltar à Inglaterra. Nesse momento, o tímido George impôs que um dos remanescentes assumisse o contrabaixo e deixou claro que não seria ele. John também tirou o corpo fora e a bomba acabou no colo de McCartney. Muito a contragosto, o canhoto adquiriu um instrumento da marca Hofner, no formato de violino, igual ao que vira ser usado por Colin Melander, músico do cantor Tony Sheridan. Assim, terminou a carreira de um guitarrista razoável e começou a trajetória de um dos maiores baixistas de todos os tempos.

Mais tarde, quando estavam prestes a gravar seu primeiro single – que aqui chamávamos de compacto -, os rapazes receberam a notícia de que o produtor da EMI, George Martin, havia vetado o baterista Pete Best, então titular absoluto da banda e o queridinho das fãs. Segundo consta, o maestro achava-o fraco e irregular, incapaz de manter o andamento das músicas. A situação ficou tensa, pois John, Paul e George recusaram-se a despedir o colega. Não por solidariedade, mas por absoluta falta de coragem. Então, a tarefa ingrata coube ao empresário Brian Epstein. A falta de empatia pelo pobre Pete era tão flagrante, que os demais já haviam convidado o senhor Starkey, popularmente conhecido como Ringo Starr, para ingressar nos Beatles, antes mesmo de consumarem a demissão.

Mas, o imbróglio não acabou por aí. Inseguro quanto a capacidade do novo baterista, George Martin já havia escalado o profissional de estúdio Andy White para gravar Love me Do, que seria o primeiro grande hit da turma. Ao chegar em Abbey Road para a sua estreia oficial como novo dono das baquetas, Ringo deu de cara com o substituto. Assim, o compacto inaugural dos Beatles saiu com o ritmo de um suplente. Somente na gravação do Long Play, o famoso bolachão, Ringo pôde demonstrar que os tambores não precisavam de outro. Este caso foi a razão pela qual o beatle baixinho e narigudo jamais perdoou o produtor, mesmo depois de sua morte em 2016. Um traço marcante da fragilidade psicológica que o fez sentir-se rejeitado pelos próprios companheiros em diversas ocasiões.

John Lennon também protagonizou algumas passagens bem interessantes e divertidas. Tão míope quanto Mr. Magoo, não usava óculos em público no início da carreira por força de contrato publicitário. Em consequência, raramente conseguia distinguir alguém na plateia dos shows. Certa noite bastante chuvosa, às vésperas do Natal, ao sair da casa da família de Paul em Liverpool, passou em frente à igreja e espantou-se com as pessoas que jogavam cartas debaixo do aguaceiro. No dia seguinte, comentou com o parceiro, que procurou tirar aquilo a limpo. Qual não foi a surpresa de Paul ao constatar que o pessoal do carteado era o presépio montado pelo padre.

Sucesso absoluto na Inglaterra e em grande parte da Europa, os Beatles não conseguiam encantar o povo dos Estados Unidos, considerados a Meca da indústria fonográfica mundial. Três tentativas já haviam sido feitas pela EMI, por meio de uma subsidiária americana: os singles de Love me Do, She Loves You e Please, Please Me foram lançados e... nada! Os Disc Jockeys – DJs - das rádios os ignoraram solenemente, até que as badaladíssimas revistas Times e News Week publicaram notinhas sobre a histeria que os fab four provocavam nos seus fãs ingleses. Coincidentemente, a gravadora acabara de distribuir no mercado norte-americano um novo compacto, com I Want to Hold Your Hands. O êxito foi imediato e estrondoso, culminando com a icônica apresentação no programa de tevê de Ed Sullivan para uma audiência recorde de mais de 78 milhões de pessoas, a chamada ‘Noite do Crime Zero’, quando nem os bandidos se dispuseram a perder o espetáculo dos quatro cabeludos. Enfim, os Estados Unidos estavam aos seus pés.

Com as portas da América escancaradas, os Beatles começaram uma badalada turnê, na qual tocaram pela primeira vez em estádios de baseball e outros espaços gigantescos. No entanto, naquele ponto da década de 1960 os equipamentos de som eram extremamente precários. Não existiam retornos para os músicos e os amplificadores da marca Vox, com apenas 100 watts de potência, eram insuficientes para reproduzir a boa técnica da banda em alta fidelidade. Acrescente-se a isso a absurda gritaria das meninas, maioria absoluta nas plateias. Quase sempre, era impossível ouvir um ao outro, particularmente para Ringo, que ficava atrás de todos, inclusive dos aparelhos. Completamente ensurdecido, o baterista acompanhava a evolução das músicas pelo balanço dos quadris dos companheiros e jamais executava viradas ou improvisava para não se arriscar, um comportamento que levou muita gente boa a considerá-lo medíocre, o que não é verdade.  Após um desses shows, já a bordo do furgão que os resgatava do olho do furacão, Harrison cumprimentou-o: ‘parabéns, Ringo, adorei o que você fez em Twist and Shout’. Ao que Ringo respondeu: ‘Ué, nós tocamos isso hoje?’.

Para terminar esta crônica, é preciso fazer justiça: não foi o empresário Brian Epstein quem inventou o corte de cabelo ao estilo pajem, que tão bem combinou com os terninhos de quatro botões e foi copiado à exaustão pela rapaziada mundo afora. A ideia foi de Astrid Kirchherr, fotógrafa alemã que capturou os Beatles pela primeira vez, lá em Hamburgo. Falecida em 13 de maio deste ano, Astrid foi também a última namorada do ex-baixista Stu Sutcliffe, razão pela qual ele deixou o grupo.

Pode ser que você já conheça todas essas histórias que contei sobre Richard, James, Winston e Harold, prontamente reconhecidos por todos como Ringo, Paul, John e George, mas é sempre muito bom recordar os dias mais felizes de nossas vidas.

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