Você já deve ter ouvido falar que o brasileiro trabalha pouco. E visto comparativos de aposentadoria por idade entre países.

Na Alemanha, por exemplo, a aposentadoria regular é paga a partir dos 65 anos de idade. Nos EUA, será de 67 anos em 2022, após dez anos ou mais de contribuições. No Japão e no México, de 65 anos, com, ao menos, 25 e 24 anos de contribuição, respectivamente.

No Brasil, a idade para aposentadoria é de 60 anos para homens e 55 anos para mulheres. Mas é uma das poucas nações em que há a possibilidade de se valer da fórmula 86-96, ou regra dos pontos, que leva em consideração a idade e o tempo de contribuição.

A idade, por si só, no entanto, não é um bom indicador para a comparação de aposentadoria em outros países. Especialistas defendem que a sobrevida (expectativa de vida após os 60 anos) exclui as mortes precoces e nivela de forma mais equânime os dados.

Os dados mais recentes de expectativa de vida após os 65 anos de idade da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), de 2017, mostram que, no Brasil, era de 19,8 anos; na Alemanha, 21,3; nos EUA, 20,6; no Japão, 24,4; e no México, 18,7.


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Ainda assim, salientam especialistas, é um risco fazer comparações entre países.

“Por se tratar de um país subdesenvolvido e com um sistema de repartição precário, a população começa a trabalhar mais cedo e, com isso, se preenchidos os requisitos, aposentam mais cedo também; e as aposentadorias são bem menores – razão que leva inúmeros aposentados a continuar trabalhando”, considera a advogada Roberta Fattori Brancato, especialista e mestre em direito previdenciário pela PUC-SP.

Além disso, completa ela, apesar de a expectativa de vida dos brasileiros ter aumentado, esse número ainda é bem inferior se comparado com os outros países, como o Japão.

O advogado e professor especialista em direito previdenciário Theodoro Vicente Agostinho acrescenta que o Brasil é um país de dimensões continentais. “Então, não dá para comparar a nossa realidade econômica com a de outros países, como Chile, Estados Unidos e Europa.”

Para a professora e advogada Luciana Moraes de Farias, mestre em direito previdenciário pela PUC-SP e organizadora do livro “Temas Atuais de Seguridade Social” (Editora LTR), comparar a situação da aposentadoria no Brasil com a de países desenvolvidos, por exemplo, “é um descalabro” – e por diversos motivos.

Aqui, diz ela, “a taxa de desemprego faz com que o trabalhador fique por muito tempo buscando uma nova recolocação e, com isso, não consiga contribuir para Previdência Social, perdendo esse período para contabilizar em sua aposentadoria”.

A questão da falta de segurança no trabalho, continua ela, é outro fator. “O alto número de afastamentos de empregados por acidentes de trabalho e doenças ocupacionais geram uma insegurança a esse trabalhador, em razão de programas chamados ‘pente fino’, nos quais há uma cessação em torno de 80% dos casos de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença.”

Em muitos casos, esse profissional entra no chamado “limbo jurídico”. Ou seja, continua incapacitado, mas, devido à sistemática, não consegue fazer a prova a tempo junto ao INSS e com isso tem o seu benefício cessado. E, tendo que voltar ao seu antigo posto, ainda sem condições para tal, é rejeitado pela empresa. “O trabalhador fica um período, até sua regularização, sem receber o benefício por incapacidade do INSS e nem receber o salário da empresa”, diz Farias.

Carga pesada

Mas, se a questão volta à idade de aposentadoria entre países, com as ressalvas que são necessárias, fica a dúvida: o brasileiro trabalha pouco? A pergunta tem uma única resposta para os especialistas: não.

Com a possibilidade de aposentadoria por tempo de serviço e por ter começado a vida laboral mais cedo, o trabalhador consegue o benefício antes dos 60 anos de idade, defende Brancato.

E com um agravante. Com a aposentadoria por tempo de contribuição, “é possível que o brasileiro se aposente com uma idade inferior a 60 anos o homem e 55 anos a mulher. No entanto, é o segurado que mais tempo contribui para à Previdência Social e que terá o menor valor de benefício”, esclarece Farias. O fator previdenciário só é aplicado se for vantajoso ao contribuinte.

Agostinho acrescenta ainda que, no país, o benefício é visto como um complemento salarial. “As pessoas não param de trabalhar porque se aposentam. Com a proposta de idade mínima, a tendência é que não ocorra mais essa situação, ou seja, trocaríamos o modelo de tempo de contribuição pelo modelo de idade mínima.”

A reforma da Previdência é importante?

Sim, segundo os advogados entrevistados pelo portal do Instituto de Longevidade. “Necessitamos de reforma tributária com mais incentivos fiscais e de uma reforma previdenciária, em virtude do aumento da expectativa de vida e diante do fato também da vida laboral do brasileiro ser iniciada mais cedo”, considera Brancato.

Mas “antes de equiparar a forma de aposentadoria entre países, é necessário equiparar as condições oferecidas aos trabalhadores”, reflete Farias.

A reforma proposta pelo Executivo guarda uma similaridade em relação ao modelo de idade mínima, à adoção da previdência privada e ao sistema de capitalização adotados em boa parte do mundo, segundo Agostinho. “O Brasil está caminhando para essa consonância.”

“Não adianta, porém, ter um modelo parecido com o de países desenvolvidos se outras questões prioritárias não estão desenvolvidas também, como saúde, empregabilidade, fiscalização e punição a quem eventualmente comete crimes contra a Previdência”, finaliza Theodoro.

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